quinta-feira, 13 de março de 2014

O que acontece quando um encontro às cegas dá certo


-Hoje eu posso, você está livre? – o celular vibrou aceso com o convite. Demorei um pouco para responder, não queria parecer desesperado.

-Claro, te pego que horas?

-Vem aqui para o centro e me avise quando chegar.

-Ok, saio em vinte minutos – comemorei em silêncio [...]

Foram poucos os minutos de conversa que antecederam o encontro, e mais alguns até o caminho do quarto. Estava com uma desconhecida em uma terça-feira de primavera e ela provavelmente tinha faltado na faculdade. Naquela noite, me contou que não gostava da aula de Sociologia. A recepcionista do hotel parecia àquelas figuras antigas dos filmes dos anos 60, ela era loira e tinha os cabelos cacheados que caiam pesados e opacos sobre uma camisa bege. Subimos dois lances de escadas, o cheiro era de nicotina e tinha uma forração vermelha fosca, colada no assoalho que me lembrava o Hotel Overlook da versão Kubrick. Sem muita intimidade fomos nos tocando timidamente como dois adolescentes. Observei que os lençóis não eram tão limpos, pareciam amarelados e o quarto cheirava uma mistura de mofo e batom velho. O rádio chiava e escutávamos o bater das portas dos outros quartos, a acústica realmente não podia ser boa pelo preço que eles ofereciam. Saímos antes de completar às 3 horas, comemos um lanche fora dali e resolvemos ir para casa. E eu lembro que pensei na distancia da sua casa até a minha e o quanto isso podia nos atrapalhar futuramente. Tudo era propício para ser apenas mais um encontro desses que nunca vinga, mas eu estava disposto a pagar para ver. Eu gostava daqueles olhos inquietos que pediam para eu ficar.

De pouco em pouco fomos emendando sonhos, os seus nos meus. Conversamos na quarta e durante o resto da semana, mas nos vimos somente no sábado. Depois vieram alguns dias sem você e a saudade bonita, aquela sem medos ou desconfianças, aquela que só traz a vontade do toque dos lábios. E aí vieram os almoços, cinemas, parcerias, respeito, declarações, quartos, lençóis, intimidade, cervejas, cigarros, banheiras, cumplicidade e risadas. E existiram os episódios especiais e memoráveis como o dia dos sorvetes artesanais, quando você ficou toda empolada porque comeu kiwi mesmo sabendo que era alérgica e depois me pediu para beijar seu pescoço que estava todo vermelho. Lembro-me da vez que me preparou uma surpresa gostosa no seu quarto, estávamos na sala e me pediu para eu buscar um travesseiro e quando eu cheguei você tinha preparado tudo com vinhos, velas e músicas boa, e eu lembro que achei incrível o coração de pétalas que fez na cama pra mim -eu juro que na hora não parecia clichê. Veio nossa primeira viagem, depois a segunda e os planos para tantas outras. E agora já temos planos para uma família grande, até falamos sobre o Milo e o Romeu, nosso filho e o nosso bulldog inglês.

E sabe por que estamos juntos até hoje? Porque demos passagem aos nossos sentimentos. Eles falaram por si. Permitimos ao que é, ser o que é! Não existe certo ou errado quando colocamos em pauta sentimentos e emoções, equem disse que um encontro casual não pode ser duradouro? Certo ou errado é o que você faz a partir do que sente. Concordo com Pedro Antônio Gabriel Anhorn que ‘desenha’ lindamente em um guardanapo o seguinte: “Grandes amores são grandes dúvidas. Não vivê-los é morrer com grandes dívidas”. Então, bora viver?

Para mim não importa se veremos Lars Von Trier ou Bertolucci, se ficaremos deitados no sofá conversando sobre nossa futura viagem enquanto passa aquela matéria chata no telejornal ou se ficaremos de pijamas no tapete do apartamento, jogando War. Não importa se teremos vinho tinto porque o tempo está chuvoso ou chocolate quente para evitar o álcool. As coisas com você são tão simples e leves que deitar ao seu lado e ficar abraçado, mesmo sem dizer nada, já é suficiente e me satisfaz. Posso deitar de conchinha e cochilar sentindo o cheiro da sua nuca ou posso morder sua orelha para ouvir você resmungar. É tudo tão fácil com você. São incontáveis as vezes que me faz sorrir no escuro, deitado, antes de dormir enquanto agradeço ao universo e relembro nossos momentos. Inenarrável o modo como você me faz sentir único. E quando você leitor, pensar que iniciar um diálogo pela internet pode ser uma furada, lembre-se que você pode estar desperdiçando a chance de ter ao lado aquela pessoa que faz suas pernas tremerem e o seu coração bater mais rápido, talvez você esteja deixando escapar por entre os dedos as melhores risadas que dará nos próximos anos. Viver é urgente e agora, é energia fluindo, permita que flua.